Pense conosco

Todos podem contribuir enviando textos, poemas, fotografias, quadrinhos, imagens, links, etc, de pensadores e artistas consagrados ou de leigos interessados em contribuir para o desenvolvimento humano no século XXI. O moderador avaliará o material enviado e se estiver de acordo com o pensamento do blog será compartilhado com todos. O e-mail para envio é: pensamentohumanista@gmail.com

domingo, 10 de julho de 2011

Daisaku Ikeda fala sobre o eu e o cosmo

Trecho do Livro “Espaço e Vida Eterna”,
de Chandra Wickramasinghe e Daisaku Ikeda, pg 60.

A visão penetrante do budismo é direcionada tanto para o cosmo interno como para o externo. Ao examinar a totalidade dos ensinos de Sakyamuni, o fundador do budismo, percebemos que, na exploração da vida interior, a meditação e a contemplação formam a base da prática. Quando o praticante combina essas duas com várias outras práticas, tais como observar os preceitos e fazer oferecimentos, mergulha cada vez mais no domínio interior de sua vida e se esforça para compreender o que existe em seu mundo interno.

A busca interior não para no plano individual, vai além, entra no domínio transpessoal. Para ser mais específico, essa busca individual abarca a vida dos familiares e dos amigos e continua se expandindo também para a sua raça, a sua nação e até mesmo toda a humanidade. E essa busca vai ainda mais além, identifica a própria vida com a de outros seres vivos e, então, transcende as fronteira do Planeta Terra e o ciclo de nascimento e morte das estrelas e, por fim, entra em fusão com o Universo. Sakyamuni percebeu, com o âmago de sua vida, a existência da “vida fundamental” que dá origem ao próprio universo.
Em outras palavras, Sakyamuni percebeu a existência do cosmo no interior de sua vida e, além disso, alcançou a fonte essencial desse cosmo, ou seja, a vida universal. Então, descobriu que essa fonte é em si una com o cosmo externo. Em seguida, fez o processo reverso, iniciou do ponto essencial da vida para depois voltar a atenção para o mundo fenomenal ou externo. Dessa forma compreendeu que essa “vida fundamental” se estendia não somente às evoluções físicas, químicas e biológicas que ocorrem em todo o cosmo externo, mas também à evolução da consciência humana; na verdade, a cada um dos fenômenos que ocorre no mundo externo.
Assim, o que é visto como interior, em seu nível supremo, é transcendente. No budismo, o interior não significa simplesmente o que existe dentro de nossa vida, mas a relação mútua do próprio cosmo interno com o cosmo externo, que constitui o mundo fenomenal. Essa relação se expressa na frase “o interior é em si transcendente” ou “a transcendência é em si interior”.

Daisaku Ikeda,

terça-feira, 5 de julho de 2011

Nelson Mandela


“ Nascemos para manifestar a glória do Universo que está dentro de nós. Não está apenas em um de nós: está em todos nós.
 E conforme deixamos nossa própria luz brilhar, inconscientemente damos às outras pessoas permissão para fazer o mesmo.
E conforme nos libertamos do nosso medo, nossa presença, automaticamente, libera os outros.” Nelson Mandela

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Trecho do livro espaço e vida eterna - Daisaku Ikeda e Chandra Wickramasinghe

Wickramasinghe:
Meus escritores favoritos são Shakespeare, Milton e Wordsworth.
Shakespeare compreendia o mundo com a percepção de um buda. A visão que ele tinha não era científica nem experimental, mas ele enxergou a verdade em relação à pessoas e ao mundo por meio de uma profunda intuição e genialidade. 
Milton era um poeta que expressava o lado espiritual da humanidade. Sua visão era certamente cristã, porém ele descrevia claramente o inextinguível desejo humano de se unir a uma grandiosa existência divina.
Wordsworth deu uma expressão encantadora às virtudes e bênçãos da natureza. Ele nos mostrou a magnificência dos verdes, que agra estamos perdendo, e a beleza das colinas e dos lagos.
Ikeda:
Há um poema de Wordsworth que é um dos meus favoritos:
Meu coração pula de alegria quando avisto
Um arco-íris no céu:
Assim me senti quando criança;
Assim me sinto agora como homem,
E assim será quando eu envelhecer,
Ou me deixem morrer!
A criança é o mestre do Homem;
E eu poderia dizer que meu desejo é que meus dias fossem
Unidos um ao outro pela espiritualidade natural.

A profunda percepção de que a "criança é o mestre do Homem" representa, para os educadores, os pais e os políticos e também para todas as pessoas que já foram crianças, uma fonte inesgotável de inspiração.

Wickramasinghe:
Eu também gosto do poema. Os adultos que perderam o desejo de infância de descobrir o mundo deixaram de viver intelectualmente. Eles descem cada vez mais na escada da vida inteligente.

Ikeda:
Então poderíamos dizer que uma vida realmente inteligente é aquela em que a pessoa jamais perde a entusiástica curiosidade e a pureza do amor que são característicos de uma criança. Uma pessoa cujo pensamente se petrificou não pode ser inteligente, por mais conhecimento que possua.
O budismo ensina que todas as pessoas devem buscar, em sua própria realidade diária e durante toda a vida, o conhecimento da "identidade do universo e da vida", em outras palavras o conhecimento do verdadeiro aspecto da atividade, da comunicação e do apoio mútuos do macrocosmo externo e do microcosmo interno.
Essa busca, essa descoberta, é uma jornada intelectual e, ao mesmo tempo, uma jornada para abrir o universo infinito em nosso interior e estabelecer uma condição de vida que nos conduzirá à criação de ilimitado valor...

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Salve a Floresta - Cacique Mutua

CARTA DO CACIQUE MUTUA SOBRE BELO MONTE

"Carta do Cacique Mutua (dos Povos Xavantes) a todos os povos da Terra

        O Sol me acordou dançando no meu rosto. Pela manhã, atravessou a palha da oca e brincou com meus olhos sonolentos. O irmão Vento, mensageiro do Grande Espírito, soprou meu nome, fazendo tremer as folhas das plantas lá fora. Eu sou Mutua, cacique da aldeia dos Xavantes. Na nossa língua, Xingu quer dizer água boa, água limpa. É o nome do nosso rio sagrado. Como guiso da serpente, o Vento anunciou perigo. Meu coração pesou como jaca madura, a garganta pediu saliva. Eu ouvi. O Grande Espírito da floresta estava bravo. Xingu banha toda a floresta com a água da vida. Ele traz alegria e sorriso no rosto dos curumins da aldeia. Xingu traz alimento para nossa tribo.
  Mas hoje nosso povo está triste. Xingu recebeu sentença de morte. Os caciques dos homens brancos vão matar nosso rio. O lamento do Vento diz que logo vem uma tal de usina para nossa terra. O nome dela é Belo Monte. No vilarejo de Altamira, vão construir a barragem. Vão tirar um monte de terra, mais do que fizeram lá longe, no canal do Panamá.
  Enquanto inundam a floresta de um lado, prendem a água de outro. Xingu vai correr mais devagar. A floresta vai secar em volta. Os animais vão morrer. Vai diminuir a desova dos peixes. E se sobrar vida, ficará triste como o índio.
  Como uma grande serpente prateada, Xingu desliza pelo Pará e Mato Grosso, refrescando toda a floresta. Xingu vai longe desembocar no Rio Amazonas e alimentar outros povos distantes. Se o rio morre, a gente também morre, os animais, a floresta, a roça, o peixe tudo morre. Aprendi isso com meu pai, o grande cacique Aritana, que me ensinou como fincar o peixe na água, usando a flecha, para servir nosso alimento.
  Se Xingu morre, o curumim do futuro dormirá para sempre no passado, levando o canto da sabedoria do nosso povo para o fundo das águas de sangue. Pela manhã, o Vento me levou para a floresta. O Espírito do Vento é apressado, tem de correr mundo, soprar o saber da alma da Natureza nos ouvidos dos outros pajés. Mas o homem branco está surdo e há muito tempo não ouve mais o Vento.
  Eu falei com a Floresta, com o Vento, com o Céu e com o Xingu. Entendo a língua da arara, da onça, do macaco, do tamanduá, da anta e do tatu. O Sol, a Lua e a Terra são sagrados para nós. Quando um índio nasce, ele se torna parte da Mãe Natureza. Nossos antepassados, muitos que partiram pela mão do homem branco, são sagrados para o meu povo.
  É verdade que, depois que homem branco chegou, o homem vermelho nunca mais foi o mesmo. Ele trouxe o espírito da doença, a gripe que matou nosso povo. E o espírito da ganância que roubou nossas árvores e matou nossos bichos. No passado, já fomos milhões. Hoje, somos somente cinco mil índios à beira do Xingu, não sei por quanto tempo.
  Na roça, ainda conseguimos plantar a mandioca, que é nosso principal alimento, junto com o peixe. Com ela, a gente faz o beiju. Conta a história que Mandioca nasceu do corpo branco de uma linda indiazinha, enterrada numa oca, por causa das lágrimas de saudades dos seus pais caídas na terra que a guardava.
O Sol me acordou dançando no meu rosto. E o Vento trouxe o clamor do rio que está bravo. Sou corajoso guerreiro, não temo nada.
  Caminharei sobre jacarés, enfrentarei o abraço de morte da jiboia e as garras terríveis da suçuarana. Por cima de todas as coisas pularei, se quiserem me segurar. Os espíritos têm sentimentos e não gostam de muito esperar.
  Eu aprendi desde pequeno a falar com o Grande Espírito da floresta. Foi num dia de chuva, quando corria sozinho dentro da mata, e senti cócegas nos pés quando pisei as sementes de castanha do chão. O meu arco e flecha seguiam a caça, enquanto eu mesmo era caçado pelas sombras dos seres mágicos da floresta. O espírito do Gavião Real agora aparece rodopiando com suas grandes asas no céu. Com um grito agudo perguntou: Quem foi o primeiro a ferir o corpo de Xingu? Meu coração apertado como a polpa do pequi não tem coragem de dizer que foi o representante do reino dos homens. O espírito do Gavião Real diz que se a artéria do Xingu for rompida por causa da barragem, a ira do rio se espalhará por toda a terra como sangue e seu cheiro será o da morte.
  O Sol me acordou brincando no meu rosto. O dia se abriu e me perguntou da vida do rio. Se matarem o Xingu, todos veremos o alimento virar areia.
  A ave de cabeça majestosa me atraiu para a reunião dos espíritos sagrados na floresta. Pisando as folhas velhas do chão com cuidado, pois a terra está grávida, segui a trilha do rio Xingu. Lembrei que, antes, a gente ia para a cidade e no caminho eu só via árvores.
 Agora, o madeireiro e o fazendeiro espremeram o índio perto do rio com o cultivo de pastos para boi e plantações mergulhadas no veneno. A terra está estragada. Depois de matar a nossa floresta, nossos animais, sujar nossos rios e derrubar nossas árvores, querem matar Xingu.
  O Sol me acordou brincando no meu rosto. E no caminho do rio passei pela Grande Árvore e uma seiva vermelha deslizava pelo seu nódulo. Quem arrancou a pele da nossa mãe? gemeu a velha senhora num sentimento profundo de dor. As palavras faltaram na minha boca. Não tinha como explicar o mal que trarão à terra. Leve a nossa voz para os quatro cantos do mundo clamou O Vento ligeiro soprará até as conchas dos ouvidos amigos ventilou por último, usando a língua antiga, enquanto as folhas no alto se debatiam.
  Nosso povo tentou gritar contra os negócios dos homens. Levamos nossa gente para falar com cacique dos brancos. Nossos caciques do Xingu viajaram preocupados e revoltados para Brasília. Eu estava lá, e vi tudo acontecer.
  Os caciques caraíbas se escondem. Não querem olhar direto nos nossos olhos. Eles dizem que nos consultaram, mas ninguém foi ouvido.
  O homem branco devia saber que nada cresce se não prestar reverência à vida e à natureza. Tudo que acontecer aqui vai voar com o Vento que não tem fronteiras. Recairá um dia em calor e sofrimento para outros povos distantes do mundo.
  O tempo da verdade chegou e existe missão em cada estrela que brilha nas ondas do Rio Xingu. Pronta para desvendar seus mistérios, tanto no mundo dos homens como na natureza.
 Eu sou o cacique Mutua e esta é minha palavra! Esta é minha dança! E este é o meu canto!
Porta-voz da nossa tradição, vamos nos fortalecer. Casa de Rezas, vamos nos fortalecer. Bicho-Espírito, vamos nos fortalecer. Maracá, vamos nos fortalecer. Vento, vamos nos fortalecer. Terra, vamos nos fortalecer. Rio Xingu! Vamos nos fortalecer!
Leve minha mensagem nas suas ondas para todo o mundo: a terra é fonte de toda vida, mas precisa de todos nós para dar vida e fazer tudo crescer. Quando você avistar um reflexo mais brilhante nas águas de um rio, lago ou mar, é a mensagem de lamento do Xingu clamando por viver.

 Cacique Mutua",
Xingu, Pará, Brasil, 08 de junho de 2011.


sexta-feira, 20 de maio de 2011

Somos um sonhar sem limite e só sonhar.


Somos um sonhar sem limite e só sonhar.
Não podemos, pois, ter idéia do que seja um não sonhar

Tudo quanto é e existe é um sentir e é o que cada um de nós tem sido sempre e continuamente. De onde pode um sentir, uma sensibilidade, tomar consciência do que possa ser um não sentir, um tempo sem fatos, pois somente há, só existe o que é fato, nosso estado em nossa sensibilidade? Nossa eternidade, um infinito sonhar igual ao presente é certíssimo.

Mas me dirão que há sonhos que cessam, que se tornam tão rebeldes que nunca os recuperamos: há os que se ocultam, as ocultações dos que talvez existam mas que não veremos nem reconheceremos mais.

Essas ocultações só existem para um Sonhar hesitante: há sonhos que reclamam para voltar à plenitude de nossa alma, uma alma transbordante, uma certeza sem sombra em nossa decisão de sonhá-los.

Quem sabe nessa fragilidade de sonhar quantas vezes afastamos o sonho dos que voltam, desacreditamos, negamos a visita plena e inteira que nos oferecia alguém que Voltava da Ocultação!

Museu do romance da Eterna, de Macedônio Fernandez

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Caminhando pelo deserto

Caminhando no deserto
Ele andava no deserto. Estava tão seco que sua pele  mais parecia escamas de peixes terrestres. O vazio tomava conta de tal maneira que seu caminhar, juntamente com seu pensamento perderam o propósito do próprio andar. Tudo que se via e sentia era areia quente.  Ele, de vez em quando, se via numa breve ilusão, em meio à um oásis com belas árvores, límpidas águas e deliciosas sombras.  Mas a ilusão era tão evidente que ele só conseguia observar de longe, sem sentir, sem tocar, sem nada adentrar. Era um expectador de algo que poderia ser o paraíso, mas que nem próximo poderia chegar para concluir se era ou não. Como em um sonho esse oásis se desfazia em sua frente. Ele ainda o via como antes, suas águas, árvores e sombras,  porém  desfeito.  Ele conseguia sentir esta ilusão se desfazendo bem na sua frente,  pois o calor  e a aridez da areia que nunca deixaram de estar presentes voltaram a aparecer.  
Em meio à sua contínua caminhada, árida, solitária e longa pelo deserto, destituída das próprias ilusões ele percebe que a melhor maneira para continuar sua jornada com forças para transformar o próprio deserto era se banhar naquele delicioso oásis, descansar e recuperar suas forças nas agradáveis sombras daquelas frondosas árvores, se alimentar de seus maravilhosos frutos. Daí poderia continuar seu longo percurso, que não duraria mais que um piscar de olhos, através daquele deserto de belezas nunca vistas antes.
E assim ele continuou, sem mais se iludir!
Abdul Issair
Poema em homenagem à Damasco interior.